Fato.
Até o ano passado, apenas se podia contar com o trabalho sistemático
(e por muitos anos incompreendido) do antropólogo fundador do GGB e
principal responsável pela iniciativa da reunião das notícias
veiculadas na imprensa sobre crimes vitimando homossexuais, travestis
e transexuais. Hoje, nem isso. O acadêmico Luiz Mott comunicou
publicamente em dezembro de 2011 que não mais faria essa compilação
dos crimes de natureza homofóbica praticados (impunemente) no
Brasil: “aviso
pela última vez: transfiro à Secretaria de Direitos Humanos a
responsabilidade pela manutenção do banco de dados sobre
assassinatos de LGBT no Brasil.”
Desde o início dessa catalogação, divulgada em agosto de 1981, no Boletim nº 1 do GGB (MOTT, 2011, pág. 11), o Grupo deixava explícito que ela era certamente incompleta. No entanto, nesses já mais de 17 anos que se tem podido contar com linhas de financiamento (nacionais, internacionais) para pesquisas e projetos, jamais qualquer ONG ou núcleo acadêmico de pesquisa teve a iniciativa de tomar a si a tarefa de aperfeiçoar aquela compilação. A única pesquisa que se tem notícia a monitorar o encaminhamento dado pelas instituições policiais e judiciárias aos delitos originários pelo ódio a LGBTs foi realizada pelos antropólogos Sérgio Carrara e Adriana R. B. Vianna, do IMS/UERJ, e divulgada em 2004.
Desde o início dessa catalogação, divulgada em agosto de 1981, no Boletim nº 1 do GGB (MOTT, 2011, pág. 11), o Grupo deixava explícito que ela era certamente incompleta. No entanto, nesses já mais de 17 anos que se tem podido contar com linhas de financiamento (nacionais, internacionais) para pesquisas e projetos, jamais qualquer ONG ou núcleo acadêmico de pesquisa teve a iniciativa de tomar a si a tarefa de aperfeiçoar aquela compilação. A única pesquisa que se tem notícia a monitorar o encaminhamento dado pelas instituições policiais e judiciárias aos delitos originários pelo ódio a LGBTs foi realizada pelos antropólogos Sérgio Carrara e Adriana R. B. Vianna, do IMS/UERJ, e divulgada em 2004.
Segundo
informam, os pesquisadores partiram de notícias veiculadas em
jornais e, em seguida, buscaram localizar os seus desdobramentos nos
arquivos da polícia e do Judiciário fluminenses. Foram encontrados
“105 registros de ocorrência e 57 processos, envolvendo 108
vítimas do sexo masculino que apareceram na imprensa como
homossexuais” (CARRARA e VIANNA, 2004, p. 366, nota 5). Parte do
mesmo contexto no qual, em 1992, por exemplo, 92% dos homicídios
foram arquivados no município do Rio de Janeiro (Soares et al apud
CARRARA e VIANNA, 2004, p. 372, nota 9), aqueles 105 registros de
ocorrência resultaram em apenas 57 processos. Dos 23 discutidos no
artigo, 15 foram arquivados; em 5 houve condenações; e em 3,
absolvição (CARRARA e VIANNA, 2004, p. 366, nota 5 e p. 372).
Os
23 processos analisados tratam de crimes de latrocínio (art. 157 do
CP). Para melhor observar e discutir as sociodinâmicas presentes
nesse tipo penal quando homossexuais (masculinos) são as vítimas,
em contexto onde a homossexualidade é culturalmente desqualificada,
Carrara e Vianna trabalham a partir da noção de “crimes de
lucro”, proposta por Ramos e Borges em 2001. Estes autores definem
“crimes de lucro” como formas de violência que visam a obtenção
de algum ganho – chantagem, extorsão, por exemplo (RAMOS e BORGES,
2001, 75). Consequência da fixação dos homossexuais no lugar da
abjeção e da ignomínia, a engendrar relações pautadas pela
clandestinidade, predominaram, nos casos presentes nos autos
examinados, a assimetria socioeconômica e geracional entre os
assassinos e suas vítimas. Em diversos deles os criminosos foram
apresentados como “garotos de programa”, embora igualmente
tenha-se verificado exceções a essa característica geral (CARRARA
e VIANNA, 2004, p. 367 e nota 7).
Depois
de examinarem os 23 processos criminais autuados entre 1981 e 1989,
tendo homossexuais masculinos como vítimas, Carrara e Vianna
concluíram que os campos policial e judiciário penal (neste
incluídos advogados, promotores e magistrados) mostravam-se
fortemente influenciados pelas noções fixadas “por psiquiatras,
sexólogos e médicos-legistas ao longo do século XX, segundo as
quais a homossexualidade era compreendida como doença ou anomalia”
(CARRARA e VIANNA, 2004, p. 366). Essa forma de representação da
homossexualidade (“a gramática ativo-passivo”, aliada às noções
das vítimas como seres “melancólicos”, “tristes”,
“solitários”, “promíscuos”, adictos ao sexo, degenerados,
anômalos) marcava de forma determinante os discursos dos
profissionais de ambos os campos e, via de consequência, os modos de
desempenho das funções investigativa e julgadora.
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