"A
sociedade caminhou mais rápido e é um desafio à Igreja, quando
deveria ser o contrário", diz Odja Barros. Foto: Thalita
Chargel
Um
dos pontos principais para a compreensão da questão à luz da
Bíblia, de acordo com Odja Barros, é desconstruir as leituras mais
hegemônicas, patriarcais, que afetam a vida não só dos gays, como
das mulheres. Há trechos, por exemplo, que justificam a submissão e
a violência contra a mulher. A própria Odja só se tornou pastora
graças a essa releitura. “As pessoas vêm me dizer que sou
feminista, que sou moderna, mas me sinto muito fiel a algo -muito
-antigo, que é a defesa da dignidade do ser humano sobre todas as
coisas. O Evangelho tem a ver com esses valores”, argumenta. “A
sociedade caminhou mais rápido e é um desafio à Igreja, quando
deveria ser o contrário.”
Entre
os católicos, curiosamente, a homossexualidade não é vetada a
partir da Bíblia, mas a partir da concepção de que seria
antinatural, ou seja, fora do objetivo da procriação. É assim, até
hoje, que prega a Igreja, daí a condenação também ao uso de
contraceptivos como a camisinha. Tudo isso vem de uma época em que
se conhecia muito pouco de biologia. A descoberta do clitóris como
fonte do prazer feminino, por exemplo, é do século XVI. O ovário,
que sacramentou a diferença entre homem e mulher, só foi descoberto
no século XVIII. Até então, pensava-se que a mulher era um homem
em desvantagem, um corpo masculino “castrado”.
“Além
disso, hoje temos conhecimento de uma gama impressionante de
comportamentos sexuais entre os animais, o que inclui
homossexualidade e hermafroditismo”, defende o padre católico
James Alison, britânico radicado em São Paulo. Homossexual
assumido, Alison conta que se situa numa espécie de “buraco negro”
em que se encontram, segundo ele, muitos padres católicos gays: sem
função como párocos, não estão subordinados a bispos e, por isso
mesmo, escapam de sanções da Igreja. O padre, que vive como
teólogo, compara a homossexualidade a ser canhoto. Ou seja, um
porcentual- da população nasceria -homossexual, assim como nascem
pessoas que escrevem com a mão esquerda. “Aproximadamente 9,5% das
pessoas são canhotas e isso também já foi considerado uma
patologia.”
Alison
conta que a Igreja Católica faz um malabarismo ideológico para
sustentar a proibição de ser homossexual-, pois no ensino teológico
do Vaticano o fato em si não é considerado pecado. “Eles dizem
que ‘enquanto a inclinação homossexual não seja em si um pecado,
é uma tendência para atos intrinsecamente maus’, uma coisa
confusa e insustentável a essa altura.” O padre acredita, porém,
que a aceitação da homossexualidade pelos católicos melhorou sob
Bento XVI. “Neste tema, os prudentes calam e os burros gritam. João
Paulo II promovia os gritões. Hoje a tendência é prudência. Já
não se veem bispos falando publicamente que é uma patologia. Se a
Igreja reconhecer que não há patologia, será natural reconhecer a
homossexualidade. É um lado bom de Ratzinger, mas tudo isso ocorre
caladamente, nos bastidores da Igreja.”
Para
o padre, a falta de discussão no catolicismo sobre a
homossexualidade “emburreceu” as pessoas para o debate em torno
da pedofilia, que tanto tem causado danos à imagem da Igreja nos
últimos anos. Daí a reação lenta diante das denúncias. E também
se tornou um obstáculo à evangelização. “A homofobia instintiva
já não é mais realidade, há cada vez mais solidariedade fraterna
concreta. Muitos jovens são por natureza gay friendly. E se
perguntam: por que seguir Jesus se tenho de odiar os gays?”
Por: Michel Franklin
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